Nov 13, 2008

Ode ao burguês

Eu insulto o burgês!
O burguês-níquel, o burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro,
italiano, é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto as aristocracias cautelosas!
os barões lampiões! os condes Joões!
os duques zurros!
que vivem dentro de muros sem pulos, e gemem sangues
de alguns mil-réis fracos para dizerem
que as filhas da senhora falam o francês
e tocam os "Printemps" com as unhas!

Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais o êxtase fará sempre Sol!

Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais
Morte ao burguês-mensal!
ao burguês-cinema! ao burguês-tílburi!
Padaria Suissa! Morte viva ao Adriano!
"_ Ai, filha, que te darei pelos teus anos?
_ Um colar... _ Conto e quinhentos!!!
Mas nós morremos de fome!"

Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!
Oh! purée de batatas morais!
Oh! cabelos nas ventas!
oh! carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!
Ódio aos relógios musculares!
Morte à infâmia!
Ódio à soma!
Ódio aos secos e molhados!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso!
Eia! Dois a dois!
Primeira posição!
Marcha!
Todos para a Central do meu rancor inebriante!

Ódio e insulto!
Ódio e raiva!
Ódio e mais ódio!

Morte ao burguês de giolhos, cheirando religião
e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo!
Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!

Fora! Fu! Fora o bom burguês!...




Mário de Andrade

Oct 12, 2008

Você pode até duvidar

Dizia Cazuza que "amor é o ridículo da vida". Eu já acho que o ridículo da vida é o ciúme. Ou eu. Antigamente eu nem sabia o que era isso, mas acho que acabei descobrindo, e me acho tão patética que chega doer. Fala sério, é uma teoria da conspiração de deixar qualquer um doente. A cabeça fica recheada de imagens que nunca aconteceram (e nem vão acontecer), e essas imagens falsas acabam sobrepondo a verdade. E é aí que entra o desgaste. A coisa nem começou e eu já vou estragando tudo. Nem sei mais onde buscar o que eu era antes e jogar toda essa desconfiança fora. Vou pedir que coloquem o cestinho de lixo ao lado daquele dos plásticos/papéis/vidros, com o selo: ciúme. Pelo amor de Deus, alguém traz minha sanidade de volta e me deixa passeando com minha confiança por aí!

http://www.youtube.com/watch?v=-YIrwblUdac

Oct 5, 2008

concluindo...








Sep 22, 2008

José, para onde?




Sep 15, 2008




May 31, 2008

cartas à mãe

"Natal, 25 de maio de 1977

Mãe,

Olha, eu fui lá no Fantástico como a senhora pediu, mas não precisavam mais do rim que a senhora queria doar. Pra falar a verdade, eu não cheguei nem mesmo a oferecer. Voltei da porta, quando vi mais de mil pessoas com o rim na mão cantando: Ela merece! Ela merece!
Mas não se preocupe, logo a TV vai lançar outra campanha fantástica de doações. Sei porque encontreo lá dentro um senhor que sofre de salário mínimo, que está com nem trinta dias de vida, se não receber um transplante de comida.Espero que milhares de telespectadores se ofereçam para a doação. O bom é que, ao contrário do transplante de rim, esse transplante não tem perigo de rejeição. Vai servir o prato de comida de qualquer doador. Não importará se o feijão do doador for A negativo ou positivo. Vale A,B e até o feijão universal, daqueles pretos.
E ali mesmo, enquanto o salariador mínimo contava seu drama, um telespectador do Leblon se ofereceu dizendo que a doação não iria lhe fazer fata, pois le tinha sempre dois pratos de comida e poderia passar muito bem com um só no almoço.
Perguntei ao sensível doador o que a família dele achava dele doar um de seus pratos de comida e ele disse: "Minha vó é contra, disse que eu queria publicidade. Mas meus pais ainda estão discutindo o problema na psicoterapia de grupo deles."
Porém um médico amigo disse que esses transplantes não são tão simples assim. Apesar de não haver rejeição, o tal transplante poderá ter efeitos colaterais gravíssimos. Segundo ele, os pró-corpos irão destruir o prato de comida, objeto estranho ao corpo do salariador mínimo. E aí, mãe, haverá necessidade de transplantes diários!Ao ouvir isso, o telespectador doador do Leblon obtemperou que o Fantástico era só aos domingos, assim ele só doaria o prato de comida dele aos domingos.

Foi isso, mãe. A benção do seu filho, Henfil.

P.S. Soube lá ainda que a próxima campanha do Fantástico será para conseguir doações de votos para transplantar em senadores, portadores de eleição indireta. E vem aí uma campanha cheia de rejeições e difícil de conseguir doadores: é a do transplante de democracia."